
É o que relata a Associação Internacional do Documentário(IDA) na sua revista"Documentary", num artigo de Anthony Kaufman intitulado "C" de Censura: A PBS corta o documentário "Art Spiegelman" e outros actos duvidosos da questionável emissora".
A televisão pública norte-americana decidiu censurar parte do documentário Art Spiegelman: Disaster Is My Muse (2024) antes de o transmitir na sua rede.
A emissora pública norte-americana Public Broadcasting Service(PBS) informou que cortou um excerto de 90 segundos do documentário, antes de ser transmitido no programa American Masters, no qual Art Spiegelman comenta uma série de cartoons anti-Trump em que descreve o presidente como "presunçoso e feio" e retrata o seu penteado como algo que parece merda com moscas. Uma das imagens diz"não se pode mascarar a força tóxica do fascismo".
Segundo os cineastas, a decisão foi imposta pelos executivos nacionais de programação da PBS e aceite pela direção da WNET, que é uma das maiores da rede de 350 estações membros da PBS e produz American Masters.
Numa resposta de um porta-voz do grupo WNET ao Documentary, este justifica a edição"porque já não se enquadrava no contexto atual. A alteração foi feita para manter a integridade e a adequação do conteúdo para transmissão neste momento".
Parece-me ser uma das justificações mais exageradas, cínicas e insultuosas que alguma vez li. Agora o censor, para além de amputar uma obra, está a dar lições de "integridade" aos seus autores.
Parte da cena eliminada | @artspegelmandoc
Curiosamente, esta peça, datada de 2016, é a única peça conhecida em que Spiegelman desenha Donald Trump e foi criada por Art para a publicação de Womans March. Como se pode ler numa destas vinhetas, Spiegelman afirma que "resistiu a desenhar a sua cara feia".
Os realizadores, Molly Bernstein e Philip Dolin, que produziram o documentário juntamente com Sam Jinishian e Alicia Sams, tinham uma opção. Segundo Sams, podiam optar por comprar de volta o acordo de licenciamento ou aceitar a decisão da PBS e avançar com a emissão. "Disseram-nos que o documentário continuava a ter uma mensagem antifascista e que o público podia decidir por si próprio", explica. "A ironia de censurar alguém que defende a liberdade de expressão pode ter escapado à PBS, mas não nos escapou a nós.
Para o Documentário, a sequência eliminada - parte da qual pode ser vista neste post do Instagram - pode ser curta, mas liga explicitamente os temas anti-fascistas do documentário e do romance gráfico seminal de Spiegelman, Maus, a uma crítica oportuna de Trump.
Como diz a académica de Spiegelman, Hillary Chute, na versão do documentário do festival: "Neste momento Trump e pós-Trump, (Spiegelman) reconheceu a utilidade de Maus como um texto para pessoas que estão a reagir explicitamente contra o fascismo e a lutar contra ele".
Para além de cortar a discussão das vinhetas políticas do documentário, a versão da PBS também removeu as palavras de Chute "neste momento Trump e pós-Trump", alterando o significado dos seus comentários e removendo o contexto original dos realizadores.
Um porta-voz da PBS disse ao Documentary: "Nós, na PBS, mantemos as nossas decisões editoriais e afirmamos que elas não têm nada a ver com a resposta a ameaças políticas. Este ano, não alterámos as nossas orientações ou práticas editoriais de longa data.
O artigo da revista Documentary também menciona outros casos em que a PBS parece obedecer antecipadamente e/ou ser intimidada pela administração Trump e seus comparsas no Congresso.
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